Âncora

Era entardecer, quando eu caminhava devagar, afundando meu pé na areia. O sol já estava quase imerso quando senti a água. A maré a encher. Eu de cabeça cheia. Tive que mergulhar novamente no passado, mais uma vez achei que não pudesse mais respirar.


Essas memórias são agridoces. Não faz mal tê-las, elas já são parte de mim, mas é preciso ter novas. É preciso continuar a escrever nessas páginas em branco. Preencher. De pé, sentindo a água subir, eu sabia que precisava abrir um pouco de espaço também, liberar a memória.

Então eu soltei, deixei afundar. Deixei a maré levar e lavar. E senti novamente, aquela sensação boa, de felicidade evidente, ali, novamente, só eu e o mar. Mais ninguém a vista. Deserto, a deriva, mas ao mesmo tempo tão certo.

Finquei meus pés na areia e aguentei o supapo das ondas, praticando equilíbrio, resistência, resiliência, força. Brincando, como uma criança. E eu fiquei ali, porque eu não tinha hora para voltar, eu não queria voltar.

Aqui, no meio dessa imensidão incerta, é o meu lugar, minha primeira e última opção, minha solução em meio a confusão, a harmonia entre tormenta e calmaria. Obrigado por me deixar ancorar aqui por um tempo, até agora, que já posso seguir em frente.


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